A Sensação de violência na cidade

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A violência que sentimos e fazemos parte nas grandes cidades e suas periferias em todo o Brasil não é fruto de um fator apenas e sim de múltiplas realidades possíveis e imagináveis. Viver e conviver próximo ao medo, em sua voraz face desconhecida, passou a ser o dia-a-dia de milhões de cidadãos neste país.

120915princSABweb.jpg Imagine você caminhando pelas ruas desertas, esburacadas, calçadas deterioradas, asfalto feito para não durar, pessoas trancadas em seus lares, hoje grandes prisões domiciliares, você com seu aparelho moderno e sua pequena fortuna diária e o sentimento iminente que tudo pode ser tomado em alguns segundos, isso inclui inevitavelmente, a vida. Ou você com seu carro, comprado em inúmeros prestações, ou não, não importa neste caso, saindo de casa para ir ao trabalho e por sair relativamente cedo, é obrigado a monitorar a movimentação nos arredores a fim de evitar que este patrimônio seja levado e ainda seja vítima de truculência e/ou estupro. Na periferia e nas capitais todos podem ser suspeitos. Para alguns basta ser negro, vestir-se de forma descolada, pintar o cabelo ou apenas ter algumas tatuagens. Para outros, basta ver uma moto e dois passageiros homens, basta ver dois jovens em uma bicicleta, basta que estes mesmos entrem nos coletivos para alguns garantirem uma descida em um ponto de ônibus qualquer. Seja qual for as motivações elas beiram uma verdadeira paranoia coletiva.

A falta de uma educação de qualidade é um dos grandes responsáveis de fato, mas não é o único. Nesse mundo capitalista em que vivemos o governo aliado às grandes corporações midiáticas e comerciais garantem o vínculo às marcas e ao gosto pela compra. O jovem, a criança, o adulto em geral é incentivado implacavelmente ao consumo. O comércio se nutre do sedutor discurso dos publicitários e estes moldam o gosto popular em sua mais profunda ânsia de fazer parte do grande jogo de ser moderno, atual, contemporâneo. O adolescente da periferia e da grande cidade quer fazer parte do mesmo banquete que o riquinho na área nobre faz. Quer ter o mesmo carro, a mesma moto, o mesmo acesso à tecnologia, da roupa ao sapato da moda. Na verdade, na construção do pensamento consumista, muitos querem também fazer parte deste processo rumo ao luxo e até a ostentação. Outro fator crucial: O glamour da violência nos cinemas, a banalização da criminalidade transvertida de ação social pela TV, a música como motor desta calamidade amoral e a paixão pelo descartável.

 3_cria1.gif O cinema americano, falando especificamente, tem um verdadeiro culto pela violência. Diretores como Tarantino, Scorsese (em alguns casos) a tornam algo natural, humano, diversão para muitos, violência gratuita para alguns, claro, eles não são culpados nem responsáveis pelo que fazem e o sentimento e indução que pode causar seu cinema, mas a brutalidade está ali e é muitas das vezes, banal e tola e um mero exercício de estilo e machismo o que acaba virando na inconsciência do garoto um paradigma de estilo e status.

Na TV, por exemplo, espalharam-se por todo o país os programais policiais. Verdadeiros banhos de sangue publicitário. Apresentadores vestidos com seus ternos para causar seriedade, mas com palavras de ordem. São contra termos como “direitos humanos”, porém não parecem saber o que realmente estão falando. Pregam o ódio de uma sociedade que já sente ódio por sua própria condição de refém do tráfico e das armas. Algumas vezes o bandido em si vira celebridade. Suas palavras e até sua postura é filmada e exposta com ridicularização. Um tiro no pé, esse mesmo bandido se torna referência em colecionar fichas criminais e prisões, em outras palavras, um anti-herói da periferia, entretanto, motivado pelo sentimento de justiça e abandono do poder público, este mesmo telespectador usa sua força coletiva e brutal para promover linchamentos deste mesmo jovem, pessoas de bem sujando suas mãos na fúria de um animal acuado.

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Em suma, viver neste país nos tempos atuais do século XXI é desafiador. Se, somos ainda meras colônias capitalistas, aos poucos vamos afundando na própria lama de nossa ignorância política. Despolitizados e cada vez mais presos nas amarras do mercado financeiro, se as taxas de desemprego parecem cair por outro lado o salário é precário, como por exemplo, os professores, que em tese, deveriam ter os mais altos salários na nação. Outro exemplo são os trabalhadores do grande comércio que são explorados até os ossos e não têm a mínima condição de escolher o tempo que vão parar para respirar. Vamos sendo encurralado ciente que é por nossa própria vontade afinal, fomos educados desde pequenos pelos comerciais, pelos desenhos na ingênua televisão matinal, pela grande mídia corporativa que era assim, que temos que ganhar muito dinheiro e que “curtir a vida” dependerá destas escolhas. Nem que estás dependam de um roubo (em pequena ou grande escala), de um desvio moral, de alguma improbidade, de mero egoísmo, ganância, psicopatia associada a consumo e sede de riqueza, não importa as maneiristas justificativas, hoje, viver neste país significa um ato de sobrevivência frente à violência que vem, não só de um lado, não só de uma classe, não só de um grupo, não só de alguém, também de um pensamento destrutivo, a busca pela felicidade, pelo dinheiro, pelo consumir tudo e jogar fora na mesma proporção para enfim nos satisfazermos em ter, ser, poder, quem sabe, viver.

 

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Por | Cronie

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A Vida Não é Um Filme

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14:26

Não, não temos controle sobre tudo e sobre os acontecimentos. Podemos planejar e ter a esperança palpável que nosso plano mirabolante ou relativamente simples, tão simples que parece ser imune à falhas, jamais se revestirá em algo que nem imaginávamos. A vida é colorida para uns tantos e cruel para muitos outros. E esse é o ‘Lado Bom da vida’. Saber que a cada passagem do ponteiro temos uma chance de recomeçar. Claro, nada poderá ser mais como antes mas nunca somos mais como éramos segundos atrás. Novas sistemas foram criados em nosso cérebro, novas certezas cimentadas em cada palavras, novas dúvidas adentrando os retrovisores e as caminhadas indo ou voltando do trabalho ou de algum lugar que agora também faz parte de um passado que jamais poderá ser  reconstruído. Como um trem vagando por trilhas pré-estabelecidas assim muitos se sentem ou como este mesmo trem, agora desgovernado, rumo ao abismo das lamentações, morte, suicido, saudades, fim, chão, lágrimas e incertezas profundas. Ser ser humano não é fácil, pensar, agir, escolher…

Ah escolher… Para Sartre escolhemos inegavelmente. Escolhemos o tempo todo. Estou escolhendo escrever neste exato segundo. Você escolheu terminar este textos, talvez, ambos escolhemos assistir a esta película de David O. Russell ou ler o romance de Matthew Quick e daqui algum tempo, continuaremos a fazer indefinidamente, escolhas.

ddddddMas algo não é fácil: Escolher recomeçar. A perda é um dos sentimentos mais devastadores de nós, humanos. Perder alguém que se amava e que por inúmeros razões possíveis se foi pode nos colocar um peso muito maior do que podemos carregar. Alguns sobretudo, desfalecem. Se descontroem em labirintos jamais retornáveis, porões escuros de lamentações e desespero. Outros entram em colapso, destroem a si mesmo como punição, julgam-se culpados por toda a desgraça existencial e física que passam e se escondem num mundo cinza, escuro, frio em sua solitária respiração. Outros simplesmente, como que vítimas de um trauma, esquecem de tudo, agem como se o tempo tivesse saltado daquele momento até o agora.

Entretanto, “O Lado bom da vida” está em também escolher mudar. Se erguer, voltar ao ponto de partida de si mesmo e se permitir entrar em um novo ciclo. Para a filosofia Taoísta, ciclos fazem parte da natureza, mas apesar de serem ciclos, eles jamais se repetem. A primavera tem todos os anos mas as folhas não são as mesmas e nem nós somos. A tarefa é desafiadora e já sabemos que tudo pode ruir novamente mesmo que façamos tudo conforme algum paradigma que por ventura temos aliados a nós. Não cabe a nós ter o controle completo da vida em toda a sua circunstância mas cabe a nós estamos dispostos a arriscar novamente. Uns se fecham em tamanha redoma anti-sofrimento, como um pessimista que detém para si um lema, uma verdade, que tudo dará errado e acreditar é uma bobagem. Porém, mergulhar novamente em um novo percurso não é necessariamente um otimismo e sim uma condição.

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Mais uma vez não temos ingerência sobre isto. Fizemos a escolha de retornar ao caminho, ao nevoeiro do destino que vai se materializando. Ou até mesmo querendo repetir erros, novas falhas, insistir mesmo na evidência da falência do que ainda acreditamos contra todos os fatos e depois ficarmos parados olhando nosso própria envelhecimento, mesmo assim, estaremos ainda escolhendo. Não basta querer, querer todos querem. É preciso mais que querer, é preciso amar. Amar. Não alguém. Não algo. Amar novamente, viver.

 

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Silver Linings Playbook (O Lado bom da vida) é um filme americano de 2012, dirigido por David O. Russell. É também uma adaptação cinematográfica do romance de Matthew Quick do mesmo nome.

Escrito por | Júlio Siqueira

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